O Brunello di Montalcino é, por si só, um dos vinhos mais prestigiados da Itália. Mas quando falamos de Case Basse di Gianfranco Soldera, entramos em um território quase mítico no mundo do vinho, onde tradição, paixão e controvérsia se entrelaçam para criar uma das histórias mais fascinantes da enologia moderna.
As Origens: Um Visionário em Montalcino
Gianfranco Soldera chegou a Montalcino em 1972, vindo de Milão, onde trabalhava como executivo de seguros. Junto com sua esposa Graziella, adquiriu a propriedade Case Basse, com apenas 3,5 hectares de vinhedos. Sua visão era clara desde o início: produzir vinhos que expressassem a pureza absoluta do terroir toscano, sem concessões à modernidade ou às tendências de mercado.
A Filosofia Radical
Soldera adotou uma abordagem que muitos consideravam extrema, mesmo para os padrões tradicionais de Montalcino:
- Agricultura biodinâmica muito antes de se tornar tendência
- Rendimentos baixíssimos, frequentemente abaixo de 20 hl/ha
- Envelhecimento prolongado em grandes botti de carvalho esloveno (nunca barriques francesas)
- Recusa total de tecnologia moderna na vinificação
- Nenhum uso de produtos químicos nos vinhedos
Sua filosofia era simples: “O vinho se faz no vinhedo, não na adega”.
O Estilo Inconfundível
Os Brunellos de Soldera são conhecidos por sua elegância etérea, estrutura sedosa e capacidade de envelhecimento extraordinária. Diferentemente de muitos Brunellos modernos, mais concentrados e potentes, os vinhos de Soldera privilegiam a finesse, a complexidade aromática e a harmonia. São vinhos que desafiam o tempo, frequentemente atingindo seu auge após 20, 30 ou até 40 anos de garrafa.
A Controvérsia e a Ruptura
Em 2013, a história de Soldera tomou um rumo dramático. Um funcionário descontente sabotou a adega, abrindo as torneiras de 62 mil litros de vinho das safras 2007 a 2012 – seis anos de produção perdidos em um único ato. A perda foi estimada em milhões de euros.
Mas a maior controvérsia veio em 2008, quando Soldera foi expulso do Consórcio do Brunello di Montalcino por se recusar a submeter seus vinhos aos testes obrigatórios. Desde então, seus vinhos não podem mais usar a denominação “Brunello di Montalcino”, sendo rotulados simplesmente como “Toscana IGT” ou “Case Basse”.
Para Soldera, isso nunca foi um problema. Ele sempre afirmou que seus vinhos transcendiam qualquer denominação.
O Legado
Gianfranco Soldera faleceu em fevereiro de 2019, aos 82 anos, deixando um legado imensurável. Seus vinhos são considerados por muitos críticos e colecionadores como os melhores exemplos de Sangiovese já produzidos. Garrafas antigas de Case Basse alcançam preços estratosféricos em leilões.
Hoje, a propriedade continua sob a gestão de sua esposa Graziella e da filha Patrizia, mantendo viva a filosofia intransigente de Gianfranco.
Por Que Soldera Importa
Em um mundo vinícola cada vez mais homogeneizado, onde consultores enólogos viajam de continente a continente produzindo vinhos similares, Soldera representou a resistência. Ele provou que é possível criar vinhos de classe mundial sem seguir modas, sem pontuações de críticos como objetivo, sem tecnologia de ponta.
Seus Brunellos – ou melhor, seus “Toscana IGT” – são testemunhos líquidos de que o verdadeiro luxo no vinho não está na concentração ou no poder, mas na autenticidade, na paciência e na conexão profunda com a terra.
Case Basse di Soldera não é apenas um vinho. É uma filosofia de vida, um manifesto contra a mediocridade, e um lembrete de que os maiores vinhos do mundo nascem da paixão inabalável de indivíduos extraordinários.
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